Pricing - Parte 2 - Otimização

Escrito por Miguel Manassés Mendes Campos, COO da BeFinance
18 01 2023
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Receita é vaidade, lucro é sanidade e caixa é rei!


Em nosso artigo anterior sobre pricing, apresentamos a ideia da utilização da precificação e de prazos para a otimização do nível de consumo e recorrência, cada vez mais importante para os novos modelos de negócios insurgentes que dependem de alta retenção e ganho de informação para a escalabilidade do produto.


Nesta parte, vamos nos atentar aos aspectos mais financeiros relacionados ao desenvolvimento de estratégias sustentáveis. Nosso foco é abrir o caminho para que o aumento da receita e da carteira de clientes possa ser efetivamente traduzido para geração de valor para a empresa.


Me mostre o dinheiro


Veremos que a relação entre uma estratégia de precificação e a administração das linhas de lucro bruto e margem de contribuição deve sempre ser clara e bem delimitada antes de qualquer avanço.


Imagine que, ao mês, meu custo do serviço vendido seja de R$ 200.000, R$100.000 dos quais são fixos e R$ 100.000 variáveis e minha receita bruta seja de R$ 340.000 com um volume de 10.000.


Nesse cenário, observamos um ticket médio igual a R$ 34, lucro bruto igual a R$ 140.000 e uma margem bruta igual a 70%.


Suponhamos então que minha estratégia altere o meu ticket médio para R$ 27 e, com isso, meu volume tenha um aumento de 4.000 vendas.


Espera, uma redução de 20,6% no ticket médio gerando um aumento de 50% em volume? Isso parece uma boa troca, certo?


À primeira vista, a estratégia teria gerado um incremento de 11,2% na receita, que passaria de R$ 340.000 para R$ 378.000. Nosso custo fixo permaneceria o mesmo, R$ 100.000, mas nosso custo variável aumentaria, saindo de R$ 100.000 para R$ 140.000, correspondente ao aumento do volume.


Assim, teríamos que o novo lucro bruto seria igual a


378.000 – 100.000 – 140.000 = 138.000


Uma queda de 2 mil em relação ao anterior! Além disso, nossa nova margem bruta seria igual a:


138.000/378.000 = 36,5%


Assim, saímos de uma posição de mercado com 70% de margem bruta para uma margem de 36,5%, uma redução de 34,5%, quase metade da nossa margem anterior!


Isso nos mostra que o foco exagerado na receita não garante que nossa operação seja bem-sucedida, devemos sempre considerar os efeitos na diluição dos custos e despesas fixas e da variação de custos e despesas variáveis diretamente atrelados ao volume. Especialmente em situações em que já nos encontramos com margens apertadas, que podem acabar levando ao prejuízo com uma política de pricing mal otimizada.


Análise de custos

Demos início à análise considerando os custos esperados da operação, isto é, os pagamentos diretamente relacionados à geração da receita.


De forma geral, podemos dividir os custos entre 3 categorias. São elas:

  • Custos fixos: Os custos fixos são pouco elásticos em relação ao volume produzido ou vendido de um produto. A proporção destes custos em relação aos custos variáveis definirá o nível de alavancagem operacional, isto é, o nível de variação das possíveis margens em relação ao volume. Um alto nível de custos fixos leva a um ponto de break-even mais agressivo, mas permite que o ganho com a escalabilidade seja mais elevado. Empresas maior participação de custos fixos são mais dependentes de receitas perenes ou de uma grande escala pouco ameaçada, mas se protegem de possíveis volatilidades de preços do mercado, uma vez que não será necessário um alto nível de substituição da estrutura operacional;

  • Custos semi-fixos: São aqueles que deverão ser ajustados a cada grande aumento ou redução do volume vendido. Na prática, grande parte dos custos fixos deverão passar por uma atualização frente a uma elevada alteração no porte da operação. Entretanto, podemos facilitar nossa análise ao segregar os de menor e maior frequências de atualização e analisar os impactos individuais de cada grupo em nossas projeções, focando nas principais contas com necessidade de otimização;

  • Custos variáveis: Componentes do cálculo da margem de contribuição, os custos variáveis são sensíveis a alteração do volume de produtos ou serviços vendidos. Dessa forma, representam a maior parte do risco de mercado dentro dos custos, uma vez que a substituição, aumento ou redução de seus componentes são diretamente dependentes do sucesso da operação. Dessa forma, empresas que possuem um alto nível de custos variáveis estão mais expostas ao mercado e possuem um menor nível de alavancagem operacional, ou seja, o efeito do crescimento de volume em seu resultado será mitigado;


Análise de Despesas

As contas de despesas são, em geral, contas que não estão diretamente atribuídas à prestação do serviço ou produção. Alguns exemplos são as despesas gerais e administrativas (ex: aluguel, água, luz) ou comerciais (ex: comissões, publicidade).


Neste ponto, recomendamos que cada empresa tenha uma classificação única de cada conta de forma que se torne adequada a cada setor e modelo de negócio. Podemos tomar como exemplo as empresas que oferecem SaaS, cuja importância da recorrência e do investimento em aquisição do cliente aumenta a dependência desses custos para o crescimento operacional, então são consideradas como variáveis. Ao mesmo passo, para empresas participantes da indústria de base tais despesas são pouco eficazes, dada a natureza de seu mercado alvo. Dessa forma, não devem ser consideradas estritamente ligadas à operação.


Margem de Contribuição e Lucro Bruto

Ao deduzir as receitas individuais dos custos variáveis diretamente atribuíveis a uma classe de produtos ou serviços e demais despesas variáveis, teremos a margem de contribuição por produto. Neste ponto, podemos realizar uma nova análise do pricing à luz dos efeitos individuais, algo que representa um grande auxílio na identificação de linhas de produto ou serviços defasados e que prejudiquem o resultado total da empresa dentro de seu portfólio.


Isto é, podemos analisar a margem de contribuição para saber se a precificação por produto está correta, em quais segmentos obtivemos maior penetração e em que produtos entregamos maior valor ao cliente, de forma que podemos reorganizar nossa estratégia de negócios e estrutura operacional em avanços de especialização ou generalização.


Ao considerar ainda os custos fixos, chegamos ao lucro bruto. Entretanto neste ponto muitas empresas possuem produtos e/ou serviços que compartilhem da mesma estrutura operacional e parte dos mesmos custos, como funcionários ou maquinário.


Nessa situação, muitos gestores realizam o rateio dos custos compartilhados. Essa prática comumente leva a políticas de rateio confusas e inviabilização de análises anteriores, além de dificultar a análise de decisões sobre o abandono de componentes do portfólio e da otimização do custo total, produtividade dos funcionários, das máquinas e demais componentes empregados.


Dessa forma, recomendamos que não seja realizado o rateio para a análise individual de itens no portfólio, mas sim que os custos fixos sejam utilizados na definição de um mix de produtos ótimo e planejamentos de receita.


Na classificação de despesas também contamos com as despesas financeiras e de P&D (pesquisa e desenvolvimento), as quais apresentam dinâmicas próprias em seus impactos no resultado. Devido a suas especificidades e relação com estrutura de capital ótima e estratégias de investimento, não trataremos de tais pontos neste artigo.


Conciliando os Tributos

Para chegar ao Lucro Líquido e consequentemente à margem líquida teremos, além das despesas operacionais e financeiras, a dedução dos impostos. Dada a diferença entre os regimes tributários brasileiros, a forma como consideraremos os tributos em nossa precificação irá diferir.


Isso se dá pois o regime de Lucro Presumido e o Simples Nacional consideram diretamente o montante de receita auferido no período, respondendo diretamente a variações na receita independentemente da margem EBIT real. Por outro lado o IRPJ e CSLL relativos ao Lucro Real serão aplicados sobre o LAIR, isto é, não respondem tão diretamente a incrementos na receita.


Uma vez deduzidos os tributos do LAIR, chegamos ao Lucro Líquido. Essa métrica representa a capacidade de autofinanciamento da empresa, uma vez que o lucro do período passa a constituir o patrimônio líquido e pode ser usado para manutenção ou expansão das atividades.


A margem líquida, isto é, LL dividido pela Receita Líquida conterá, idealmente, todas as receitas e despesas de competência do período apurado. Entre tais contas se encontram também receitas e despesas não operacionais, o que a torna a melhor métrica de base para a realização do pricing em empresas que possuem resultado financeiro ou não operacional representativo, uma vez que o EBIT e a margem EBIT não englobam tais efeitos.


Para companhias que não possuem tais efeitos não operacionais, no entanto, torna-se facultativo o uso da margem líquida ou da margem EBIT, uma vez que os efeitos dos impostos serão uma taxa independente desses fatores.


Definindo o alvo


A realização do cálculo do pricing alvo necessita da determinação de margens meta. A escolha de tais margens, por sua vez, será diretamente dependente da natureza do negócio, do planejamento estratégico e da elasticidade da demanda.


Cenário de volume estático


Para casos em que não temos posse de dados suficientes para realizar uma estimativa confiável da elasticidade do volume vendido, podemos realizar a definição do pricing em um cenário estático. Esse cenário não será o mais realista, mas pode servir como norte para o início da reestruturação de operações deficitárias.


Nesta situação, iniciaremos definindo uma margem alvo e utilizaremos essas definições para chegarmos ao preço.


Precificação em um estágio


Para empresas que possuam uma linha de receitas única, podemos utilizar a precificação em um estágio. Isso significa definir o preço alvo considerando que as alterações feitas individualmente serão totalmente refletidas na margem total do negócio, o que faz com que possamos englobar em nossos cálculos os custos e despesas fixos sem recorrer à realização do rateio.


Para chegarmos à formula correta, vamos primeiro tomar o cálculo do LL


LL = Receita Bruta – Deduções – Custos – Despesas de SG&A + Resultado Financeiro + Resultado Não Operacional


Expandindo os componentes acima e desenvolvendo a fórmula, teremos o seguinte:


LL = (Preço x Volume) – Deduções Operacionais – Deduções Tributárias – Custos Variáveis – Custos Fixos – Despesas Variáveis – Despesas Faixas + Resultado Financeiro + Resultado Não Operacional


LL = (Preço x Volume) – Deduções Operacionais – (%Alíquota x Preço x Volume) – (%Custos Var. x Preço x Volume) – Custos Fixos – (%Despesas Var. x Preço x Volume) – Despesas Fixas + Resultado Financeiro + Resultado Não Operacional


Uma vez que Margem Líquida = LL/Receita Líquida


Margem Líquida = LL/(Preço x Volume – Deduções Op. – %Alíquota x Preço x Volume)


Margem Líquida = LL/[(Preço x Volume)(1 – %Alíquota)-Deduções Op.]


Por fim, substituindo e concluindo o desenvolvimento, teremos:


Margem Líquida = (Preço x Volume) – Deduções Operacionais – (%Alíquota x Preço x Volume) – (%Custos Var. x Preço x Volume) – Custos Fixos – (%Despesas Var. x Preço x Volume) – Despesas Fixas + Resultado Financeiro + Resultado Não Operacional/[(Preço x Volume)(1 – %Alíquota)-Deduções Op.]


Preço = - {[Deduções Op. x (- Margem Líquida) + Deduções Op. + Custos Fixos + Despesas Fixas – Resultado Financeiro – Resultado N.Op./[Volume x ( %Alíquotas x (-Margem Líquida) + %Alíquotas + %Custos Var. + %Despesas Var. + %Margem Líquida – 1)]}


Com a fórmula acima, somos capazes de chegar ao preço que nos levaria à margem líquida desejada, ceteris paribus.


Traçando a curva de demanda


Para estimarmos a elasticidade da demanda, isto é, a variação na demanda por um produto ou serviço pela variação do preço, é necessário que utilizemos uma base de dados empírica. Nesse sentido, podemos estruturar segmentações de mercado regionais ou demográficas e analisar as alterações no número de vendas em cada situação em relação à mudança unitária no preço. Vale lembrar que o tempo de resposta do mercado, e consequentemente o tempo de obtenção dessa base de dados, será diretamente dependente do segmento de atuação e do serviço ou produto ofertado.


Com a obtenção desses dados, poderíamos estimar o ponto de maximização da receita, entretanto, como foi discutido anteriormente, a não consideração dos custos marginais poderia levar a uma piora no resultado obtido.


Logo, considerando que obtenhamos a elasticidade do produto e dado que a elasticidade pode ser representada pela fórmula:


Elasticidade Aproximada = (Var. Volume)/(Var. Preço) = (Volume Final – Volume Inicial)/(Preço Final – Preço Inicial)


Podemos substituir a definição anterior de volume por:


Volume Final = Elast. x (Var. Preço) + Vol. Inicial


Substituindo essa definição na equação anterior, teremos:


Preço Final = - {[Deduções Op. x (- Margem Líquida) + Deduções Op. + Custos Fixos + Despesas Fixas – Resultado Financeiro – Resultado N.Op./[ (Elast. x Var.Preço + Vol.Inicial) x ( %Alíquotas x (-Margem Líquida) + %Alíquotas + %Custos Var. + %Despesas Var. + %Margem Líquida – 1)]}


O que nos leva a uma nova definição na otimização que permite englobar o novo volume esperado na definição do preço. Essa definição, entretanto, é uma fórmula matemática extensa, por isso nos reservaremos de adicionar aqui sua demonstração.


Recomendamos que utilizem ferramentas computadorizadas para chegar ao ponto ótimo, como nossa ferramenta de pricing ou o Solver do Excel


Com isso, fechamos os principais pontos sobre a precificação, desde a teoria da demanda e do consumo até a conciliação quantitativa com as demais contas de custos e despesas. Este tema pode se estender mais em termos de técnicas, modelos e características únicas de cada empresa. Entretanto, as ferramentas disponibilizadas nesses artigos formarão um leque de habilidades que poderá ser utilizado em qualquer empresa.


Esperamos ter ajudado um pouco na sua jornada em busca do conhecimento. Fique atento a nosso blog para as próximas atualizações!



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Experiência em análise de ETFs, ações e operações estruturadas, atuando também em valuation para M&A, com foco em startups e PMEs, e realizando consultorias estratégicas e FP&A. Agora, busca ajudar empreendedores com seu conhecimento.

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